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segunda-feira, 30 de novembro de 2015

A MONTANHA (Sérgio Filho)


Às vezes a vida me parece uma viagem ao desconhecido. Ora, a gente nasce sem saber, vive sem saber e morre sem saber de nada. Deve ser isso mesmo. Mas nem isso eu sei. Vai ver tem sentido. Propósito? Já não sei. Já achei que sim, hoje acho que não. 

O fato é que parece fazer sentido que o nosso propósito seja então se alinhar a esse movimento. Já que a gente sai do ventre sem saber pra onde ir, decidi fazer o mesmo, agora que sou grande (tá bom, nem tão grande assim). 

É claro que, graças a alguns seres tão especiais que nem tenho como descrevê-los, ainda tenho casas. Sim, casas. Porque algum dia eu descobri que não dava para não ir ver o mundo. Que não dava para não ouvir outra língua, outro jeito de falar a minha língua, outro jeito de olhar as coisas. Que não dava pra pegar o caminho mais curto, pois as horas que eu iria economizar são aquelas que guardam as melhores visões, as melhores reflexões, as melhores ideias. Que o avião que eu deixei de tomar e as horas a mais que eu passei no ônibus foram as que me permitiram o melhor encontro. 

Hoje eu subo a montanha. Amanhã vai saber... 

Fonte: Aroldo Galindo

domingo, 14 de dezembro de 2014

Saudade é Diferente - João Cunha




SAUDADE É DIFERENTE
João Cunha


MINHA SAUDADE É DIFERENTE DA SUA...

MINHA SAUDADE É DIFERENTE...
TÃO BELA!... TÃO NUA!..
MINHA SAUDADE PASSA DE REPENTE,
FINDA AO SOL... RENASCE À LUA.

MINHA SAUDADE ME FAZ TÃO FELIZ!
DO MARCO ZERO À IMPERATRIZ.
DERRAMANDO POESIA EM CANÇÕES
VIOLINOS, VIOLÕES,
CLARINETES, CLARINS!

NA ARSENAL TODOS PARAM PRA VER
O MEU POVO, EM SAUDADE, NA RUA...
SÓ ALI VOCÊ ENTENDE POR QUE
MINHA SAUDADE DIFERE DA SUA...

MINHA SAUDADE É DIFERENTE
CANTA PONTES, RIO E MAR...
MINHA SAUDADE,
PASSA CANTANDO PRA GENTE
FAZ MEU RECIFE SONHAR...
MINHA SAUDADE É DIFERENTE DA SUA...
LÁ, LAIÁ, LAIÁ, LAIÁ, LÁ...

[Na voz do grande seu KAYTO.]

domingo, 22 de setembro de 2013

O que em mim é solidão

O que em mim é solidão,
solidão devasta,
agasta, 
arrasta...

O que em mim é solidão,
solidão dói,
corrói,
destrói,
mói,
remói...

despovoa...

silencia...

DiAfonso

domingo, 21 de julho de 2013

É no asfalto que me falto...


É no asfalto que me falto,
não me farto.

Sou da terra batida,
rachada, ressequida...
plantas rasteiras irrompendo,
vazando céu acima...
Afrontando a morte.

É no asfalto que me falto,
não me farto.

Sou da terra úmida,
lamacenta, intumescida...
lodos entranhando por sob e sobre os dedos dos pés,
vazando céu acima...
Afrontando a morte.

É no asfalto que me falto,
não me farto.

Sou protopedras portuguesas,
o silêncio dos arrecifes 
em meio ao alarido das ondas...
Corpo que se cobre com a virgem terra
de meus ancestrais,
Vazando céu acima...
Afrontando a morte.

É no asfalto que me falto,
não me farto...


DiAfonso


domingo, 21 de outubro de 2012

Porque hoje é dia do Poeta

Especialmente, para um grande poeta pernambucano, do bairro de Tejipió: o meu grande cumpadi e irmão mais velho Luiz Eurico de Melo Neto [EU-LÍRICO]


domingo, 29 de abril de 2012

HERESIAS Nº 2


Avia-te, ó Bardo!  

Estás na humilde trípode 
e em ti se evocam as vozes femininas 
dos arcanos celestes.  

Não és mais teu. 
E os orbitais 
das cousas indizíveis 
invadem-te as sinapses.   

Avia-te! 
E retoma o Caminho.       

Fonte da imagem:  
http://www.flickr.com/photos/11970671@N06/1215151443/in/photostream/

HERESIAS Nº 1


Uma infinidade de justapostas (in)certezas 
formam em minhalma um instável mosaico.  

Mil ritos sufocam-me 
e a profusão de verdades litúrgicas engessa-me a emoção.  

...Sonho a liberdade de uma Samaria proscrita...   

Já não temos poços, nem cântaros; 
A brisa sopra onde quer. 
Beberei das nuvens que escorrem 
das Tuas Mãos em concha. 
Retomo as minhas pegadas nesse oculto Caminho do Interior.      

Imagem recolhida do Google.



sexta-feira, 22 de julho de 2011

SÉRIE: OS SENTIDOS (O SENTIDO) Nº 4


CANÇÃO DE TUDO (poema nº 4)

Há uma melodia em tudo o que se move.
Uma música browniana,
eu diria,
que há mesmo um timbre subreptício
no fluxo do ser das coisas ab initio.
Uma música do carreiro de formigas e das galáxias.
Uma música de tudo...

Desde o movimento imenso, o belo Sete-estrêlo ,
até o humilde arroio, em seu áspero leito.

Esse silêncio.

a débil vibração das asas de uma vespa.
e uma oitava acima, o luminoso som da aurora boreal,
Os entretons da voz sonora
das carambolas
que ora penduleiam
entre as galhas que farfalham
que espalham uma melodia

Os sons.
A impressão dos sons...
esse ranger de dentes
um interno trote,
um galope, o coração..

A voz presa na glote,
o fagote,
a úvula, a uva e o euritmo da chuva.

O cravo temperado
o som das mangas verdes (não ouves e não vedes?)

Gravetos percutidos pelos pés.
Mil setas que sibilam.
E o pipilar das aves, dentro e fora.

A música do agora 
brilhante e bela música
de uma eterna estação
Ecoa consoante
desde antes,
muito antes,
na música desse instante.


Fonte das imagens: http://ini.topotesia.net/node/1079

https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgYoNFIQvlSOyoVQSKQVh4PSonH9A6zoEMKnx6H9f44hKNqmvdlEGfYBEHlLwlSK_5vxgWI7fXaBDFPbZSC2PEp0pEVbRpspNK-WerQWmvMLQefaisET-ZJjWCvdkojsQ1czThox25boqzZ/s1600/manga.jpg

Nota do blogueiro:

(canção a ser musicada ao violão)

domingo, 17 de julho de 2011

UMA LOA (para o Mestre Diógenes Afonso de Oliveira)

***
Aprecio certos vocábulos arcaicos, os quais, embora egressos de um léxico avoengo e desusado, continuam preservados pelo linguajar do povo. Loar é um deles.

O verbo Loar ainda guarda os dois sentidos: tanto o da ação de louvar, fazer discurso laudatório; quanto o de intróito ao drama, prólogo, apresentação do espetáculo; como era costume, segundo Aurélio Buarque de Holanda, no teatro ibérico dos séculos XVI e XVII.


O povo nordestino, mui sábio, também costuma usar a loa, rimada e, quase sempre, metrificada, antes de engolir uma boa dose de cachaça. Antes de tomar a lapada, louva-se e introduz-se, em seguida, a bebida goela abaixo.


Esse é o meu intuito, e tão somente esse, ao apresentar, neste zine-blog literário, os poemas desse Mestre: introduzir os textos, antes da fruição da leitura. Louvação e introdução é o que querem ser essas palavras de pórtico. Loar. Loor. Loa.

Não sei se é propriamente uma fruição, o sentimento que nos traz a leitura dos textos abaixo, pois o Mestre Diógenes é dono de uma potência criadora próxima da dos pugilistas. Sua força poética quase nos nocauteia. As imagens acachapantes da sua agonia nos falam, também, da nossa agonia. Seus versos caosagônicos tratam de uma angústia que me faz lembrar, em sua essência, a de um outro Mestre, o grande basco Dom Miguel de Unamuno, cuja obra, A Agonia do Cristianismo, percorremos dia desses.


Assim como o Varão de Bilbao, também se esforça, Dom Diógenes Afonso, por apresentar-se ao leitor, não apenas como Poeta ou Autor, e sim, como um homem de carne e osso, com o flanco nu, adentrando a arena:

“o homem de carne e osso, aquele que nasce, sofre e morre, - sobretudo o que morre - aquele que come e bebe e joga e dorme e pensa e quer; o homem a quem vemos e ouvimos, o irmão, o verdadeiro irmão”. (Unamuno)

Fala-nos o homem Diógenes que se problematiza, que se faz a questão de si mesmo (mihi quaestio factus sum, como em Santo Agostinho). Sua obra poética é, ela mesma, reduto e registro inominável de sua problematicidade. Como neste insólito e belo

INEQUAÇÕES:


Sou matemático de cabeça para baixo:
as inequações, marcas de minha impotência;
os números, teimosia de infinitude,
postergando o meu capturar definitivo.

Sou matemático de uma agônica geometria:
as linhas, tortas por um contorno inacabado;
as esferas, derretidas na frouxidão do tempo
(talvez, doidamente, mais lânguidas que os relógios-tempo de Dali);
os trapézios, trapalhadas trôpegas
de um discurso falido.


*************************************************************

No entanto, radicam-se no homem todas as realidades, e ao se impor como a questão de si mesmo, encontrará, irremediavelmente, o outro que não ele.

Dom Diógenes, como Unamuno, é um homem de seu tempo, que busca salvar a sua circunstância e com ela salvar-se a si mesmo. Ao chorar, num poema, as agruras de seu recém-nascido filho Victor, (hoje, um victorioso e saudável rapagão), chorava também as dores da alteridade, do próximo, do humano:

PRA QUE NÃO CHORES

(poesia pra Victor)

Porque a miséria, Victor,
tem o semblante da
morte
em vida que desponta
cadavérica e ameaçadora
como carvalho dês
aponta
no cerne da noite.

Porque a miséria, Victor,
faz disparar em
retirada
os sonhos que
por um,
por mil,
por milhões,
por infinitos... vãos desejos
se pretendem
sonhar!

Porque a miséria, Victor,
faz o seio do homem
inflar
de sangue-latino, latindo
como cão danado
uivo-desespero explodindo
inerte no ódio!

*******************************************************

Não escapará de si mesmo, tampouco do Deus em que acredita. Sua crença se apresenta sob certa tensão, certo embate interior com um cristianismo que professa crítica e crísticamente, quase dizia, unamunianamente. Bom exemplo disso é esse soco final, digo, poema final, que considero ser a obra prima de Dom Diógenes Afonso de Oliveira:

***

CAOSAGONIA: um acorde com ninguém.

Meu cansaço esfacela-se sem nome
E eu esbravejo matilhas ofegantes, espumando
Pela Caça Fugidia que desliza espectral
Dos ombros inefáveis de Deus.

Meu cansaço esfacela-se sem nome
E eu estremeço legiões de demônios, temendo
Pelo Tudo Distante que emerge seminal
Dos ombros inomináveis de Deus.

Meu cansaço esfacela-se sem nome
E eu... Que esbravejo por essa Caça,
Que estremeço por este Tudo,
Que enlouqueço por este Lugar-Nenhum,
Busco desbravar o labiríntico
Dessas sendas sem nomes:
Golpes golfando impotência
Diante dos ombros absurdos de Deus .

.......................................................(Diafonso).

Como arremate, trago esse poema, de um homem que se confessa demasiadamente humano:

Ícaro (A vertigem)

Eis o homem:
Ícaro de asas amputadas
De alma pútrida...
Áptero... pávido...
Insano... sem dó... dor só!

Eis o homem!
Acordado sem acordes
Ccom os quais dançar
(dançarino do nada: dor só)

Eis o homem!
Acordado sem cor
Ccom a qual se pintar
(dândi do nada: dor só)

Eis o homem!
Acordado sem palavras,
Sem verbo,
Sem vida
Com a qual apodrecer
em seu túmulo caiado de trevas
(divindade do nada: dor só!)

Eis o homem:
Dançarino... nada!
Dândi... nada!
Divindade... nada!

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Leia mais em

TERRA BRASILIS ou em, SPIRITUS

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Eurico, julho/2011
homenagem, pelo aniversário do Poeta.

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sábado, 25 de junho de 2011

Estrada Velha do Curado, 2011

Antiga casa de meus pais,  em um dia de  des/arrumação

Que é, mesmo, estar em um lugar?
Hic.
Illic.
Ubique.
Repousar no espaço
a se ver passar no tempo?

Aqui,
ali
e em toda parte,
estar é ser, se estiver todo.

Estar é essa presença plena
de onde em quando
o ser palpita, aquilo
que se con/sente vivo:

Do alpendre, a cerca viva,
a ubaia, ácida e cíclica,
e o vento ainda a empoar a estrada antiga...

Eu sou esse lugar que passa, a poeira, a casa reformada...
Sou esse estar...
E só há lugar nisso em que me entrego.
Se inteiro não me estou, não há lugar.


Imagem da casa:
http://sitiodolinda.blogspot.com/2008/04/o-que-o-stio-dolinda.html


Esse é o meu grande amigo Lula! Quantas vezes estive nesta casa e só agora ela se me apresenta poetizada no ser que a habitou. Minha casa é meu reino, já disseram... Parabéns grande e iluminado poeta!

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